Monólogo de Gratidão (À minha querida
enxada)
Por:
Kener Pereira Coutinho Neves
(Benoni Coutinho Neves) – 54/55
Faz muito tempo, eu tinha cinco anos
(Benoni Coutinho Neves) – 54/55
Faz muito tempo, eu tinha cinco anos
Quando
você entrou na minha vida
Papai
comprou você de uns ciganos
Era uma
enxada grande e bem fornida
Assim
ganhei você como um presente
E juntos
começamos nossa história
É pena
que o papai já esteja ausente
Embora eu
o guarde sempre na memória
Foi ele
quem botou-lhe um cabo reto
Bateu a
cunha com muito cuidado
E após
testar você nos pés de abeto
Olhou-me
e fez sinal de “aprovado”
Já no dia
seguinte começamos
Você era
rebelde e eu também
Por algum
tempo nós nos maltratamos
Igual a
Julieta e Romeu
Cheguei a
atirá-la num lajedo
Quem
sabe, você ficava mais terna
Logo a
seguir fiquei morto de medo:
Você
pulou e feriu minha perna
Somente
quando eu já de mãos calosas
Você, sem
aspereza, o cabo liso
É que
vimos que as coisas dolorosas
Doem
muito mais em quem não tem juízo
Você nos
ajudava na labuta
Plantávamos
feijão, milho, mandioca,
Nas
noites de caçada era uma luta
Nós íamos
cavar tatu na toca
Recordo-me
quando salvaste-me a vida
Fazendo
em pleno ar uma manobra
Livrando-me
de uma fatal mordida
Decepando
a cabeça de uma cobra
Cavamos
fundações de alvenaria
Construímos
as casas dos parentes
A
capelinha da Virgem Maria
E um
ambulatório pra doentes
Enquanto
eu fui crescendo em estatura
Você
diminuiu, foi se gastando
Mas
continua ainda forte, dura
Sem nunca
esmorecer, sempre cavando
Das
atribuições que você tinha
Só uma de
deixava entristecido:
Quando
morria alguém você já vinha
Abrir a
cova para o falecido
Mas hoje
eu compreendo o seu destino
Agora sei
porque você é forte
Você me
acompanhou desde menino
Você vai
estar comigo em minha morte.
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